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ACERCA DO JULGAMENTO DO STF SOBRE PRISÃO APÓS SEGUNDA INSTÂNCIA E AS LIBERTAÇÕES DECORRENTES


Por Adriano Espíndola Cavalheiro[1]

Vejo que, como era esperado, os debates estão vivos e intensos sobre o julgamento do STF sobre a questão da prisão em segunda instância, em especial, porque, um dos libertados por ele foi um dos presos que, de uma só vez, é o mais amados e o mais odiado da história recente do Brasil. Óbvio que falo de Lula.

Como apontado acima, o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, preceitua que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"

A matéria sepultada pelo STF, ao menos por ora, porquanto todos os defuntos devem ser insepultos para o bem da jurisprudência, do contrário teríamos o engessamento desta e não seríamos os advogados, em qualquer área do direito, mais necessários, bastariam “técnicos em direito”, pois a advocacia não mais necessitária da atividade interpretativa e, assim, até mesmo estes “técnicos”, poderiam facilmente ser substituídos, por softwares, por máquinas.

Por isso mesmo não concordando com o referido entendimento, gostei, da interpretação de alguns colegas sobre o dispositivo constitucional acima transcrito, que afirmam que a proibição de ser considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória “é bem diferente de apenas possibilitar prisão apenas após (esse) trânsito em julgado".

Não sou criminalista, todos sabem disso, mas ouso discordar da colega, sendo que quero destacar, pois muitos confundem isso, que não sou lulista e nem petista. Sou apenas alguém que, sempre muito crítico, estudou e estuda direito constitucional. É por meio dele, do Direito Constitucional, que me armo para os combates que os desmandos legislativos e, também, judiciários, na minha área principal de atuação, o Direito do Trabalho, exigem. Depois de 2017, com a aprovação da “Reforma Trabalhista”, em cerca de 60% da fundamentação de minhas Iniciais Trabalhistas, quem já me "contestou" sabe bem disso, eu discuto Direito Constitucional e Direito Internacional, aplicando-os na esfera trabalhista.

Como eu disse em outra oportunidade, esse acúmulo de estudo me permite compreender que a Constituição Federal se sobrepõe às leis penais e, ainda, que cabe ao STF o papel de “Guardião da Constituição” e não de um interprete que a aplica de modo a negar sua própria vigência.

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Deste modo, com todo o respeito que merecem os cinco prolatores dos votos vencidos no julgamento que aqui se discute, me parece que eles pretendiam isso: Agir como “guardiões da interpretação negatória dos preceitos constitucionais e da própria Magna Carta” (como vem sendo feito, com muita frequência, aliás, pela Excelsa Corte. Vejam, por exemplo, o entendimento adotado pelo STF, no julgamento da desaposentação, onde as conveniências política e econômica ditaram a interpretação constitucional da Corte).

Dito isto, é preciso destacar que fundamentos da República Federativa do Brasil, estão previsto na Constituição de 1988 e são eles, o da soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e pluralismo político. Lado outro, temos direitos e garantias fundamentais que são considerados cláusulas pétreas, ou seja, disposições da Constituição que não podem ser modificadas por reformas constitucionais. Entre eles estão os direitos e garantias individuais, que estão previstos, em especial, no artigo 5º da CF!

E vejam, a Norma Constitucional que aqui me propus a discutir ("ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória") está estabelecida no ARTIGO 5º inciso LVII, da Constituição Federal!

Assim, não obstante as vozes em contrário, entre as quais a do Nobre Ministro da Justiça, o ex-Juiz Sérgio Moro, apelidado por seus críticos de Marreco, a quem guardo apenas o respeito que o cargo lhe garante, não há que se falar em emenda constitucional sobre o tema!

Assim, não há dúvidas que o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal deve ser entendido como a garantida de ninguém ser recolhido preso antes de transito em julgado de sentença penal condenatória, pois, pode-se, perfeitamente acontecer de absolvição ao final do processo.

Ora, o recolhido preso é privado do contato com seus familiares, como seus amigos, do exercício das atividades de sua vida cotidiana, da vida política e social, tanto do ponto de vista individual e, até mesmo coletivo. Se ele for considerado inocente ao final do processo, não há como reparar o dano sofrido pelo indivíduo, que levado ao cárcere restará estigmatizado, terá cumprido uma pena que a ele nunca deveria ter sido imposta. Pode ter perdido esposa, filhos, netos e, ainda, ver tiranos subindo ao poder! É o que ocorre, por exemplo, com Rafael Braga*[2] e tantos outros presos após decisões de segunda instância, não transitadas em julgado.

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Além de tudo isso, vez que estou falando de forma generalizada e não apenas de presos com direito a cela especial, como nós advogadas e advogados, que temos direito às celas especiais, todos sabemos que são altamente insalubres as condições dos presídios brasileiros. Não é lugar para se recuperar quem quer que seja. Os que se recuperam deveriam ter o caso analisado pelo Vaticano. Podem ser considerados agraciados por verdadeiros milagres!

Obviamente, para toda regra há exceções, vejamos, por exemplo, já que se falar de políticos presos (presos políticos para alguns, não para mim) está em voga, o casal Garotinho: Faz poucos dias que, mais uma vez, foi novamente preso, antes de trânsito em julgado da decisão. Isso pode perfeitamente acontecer quando o indiciado ou processado ameaçar a vítima ou testemunhas ou, em caso que ele venha a tentar destruir provas.

Então, com todo o respeito, engana-se (ou no caso dos políticos, mentem) os que estão dizendo que a decisão do STF vai colocar mais de 300 mil presos perigosos nas ruas. A realidade é bem diversa...

Deste modo, a prisão antes do transito em julgado condenação, viola expressamente o princípio da dignidade humana, alicerce do estado democrático de direito em nosso país, um princípio fundamental, conforme consta do artigo 1º de nossa Constituição e, ainda, direitos fundamentais e garantias inalteráveis, por lei ou emenda constitucional, como o estabelecido no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Além do mais, viola a garantia consagrada no Pacto de São José da Costa Rica, em seu art. 8º, item 2, o qual dispõe que “toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa” e, também, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu art. XI há expressa menção quando a garantia de que o acusado de um ato delituoso seja presumido inocente “inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”, preceitos internacionais do qual o Brasil é signatário e que, por isso, têm que ser observados por aqui.

Agora espero que o Ministério Público, as Defensorias Públicas, associações de advogados, entidades de classe e de moradores de regiões pobres, se organizem para libertarem também os de baixo, o povo pobre, preto e favelado, milhares que, como Rafael Braga, DJ Renan, etc, estão indevidamente presos.

Desculpem o textão, mas vivemos momentos nos quais expressar a nossa indignação é um direito do qual não podemos abrir mão!


NOTAS:


[1] Adriano Espíndola Cavalheiro, é Advogado em Uberaba/MG e colaborador da AnoTa – Agência de Notícias Alternativas e da Web Rádio Censura Livre.


[2] Rafael Braga Vieira é um catador de recicláveis brasileiro, reconhecido como único condenado em circunstância relacionada aos protestos no Brasil em 2013. Seu crime, portar pinho sol e água sanitária, quando abordado por policiais na região dos protestos.



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