Abaixo compartilho com os leitores do Blog de Nosso Escritório, parecer jurídico sobre a flexibilização para 30 horas da jornada do servidor público federal.
Leia e compartilhe.
Dr. Adriano Espíndola Cavalheiro
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PARECER 10/2014:
OS ASPECTOS LEGAIS DA JORNADA DE 30 HORAS
QUESTIONAMENTO: Quais são os aspectos legais para a implementação da jornada de 30 horas?
CONSULENTES: Sindicato dos Trabalhadores Técnico-Administrativos em Educação das Instituições Federais de Ensino Superior do Munícipio De Uberaba / SINTE-MED E Comissão Responsável pela Apresentação de Proposta de viabilidade de Implantação do Decreto 4.836/2003 na UFTM /COMISSÃO DAS 30H
Em atendimento às reivindicações do Comando Local de Greve e do SINTE-MED, apresentadas quando do movimento paredista de 2014, o Magnífico Reitor da Universidade Federal do Triângulo, Professor Virmondes Rodrigues Junior, fez publicar a Portaria de N° 664/2014, nomeando uma Comissão para fins de implantação da jornada de trabalho de 06 horas diárias e 30 horas semanais no âmbito da referida Universidade (Decreto 4.836/2003).
Este texto é apresentado como colaboração e parte do Seminário Jurídico promovido por essa Comissão, para subsidiar o seu trabalho. É uma colaboração da assessoria jurídica do SINTE-MED a este importe processo.
Antes de tudo, saliento que a Comissão de 30 horas da UFTM deve destacar em seu relatório final, se por elas concluir, as vantagens da implementação da jornada de 30 horas semanais nesta Universidade.
Entretanto, alerto para que seja evitadas declarações no sentido de que a jornada de trabalho de 30 horas é apenas uma vantagem para o servidor, no sentido de que trabalhando menos, ele teria opção de conseguir novo emprego. Esse cuidado deve ser tomado, inclusive, quando da oitiva dos servidores em seus locais de trabalho, orientando-os para não fazerem declarações naquele sentido.
Dito isto, são as vantagens que sugiro sejam assinaladas pela Comissão 30h/UFTM, se o seu trabalho chegar a tais conclusões:
- Para a UFTM - Otimização da estrutura organizacional, podendo aumentar a qualidade e eficiência dos serviços prestados, em consonância com os princípios que regem a Administração Pública e dentro dos limites estabelecidos pela Lei nº 8.112/90.
- PARA OS USUÁRIOS / PÚBLICO - Ampliação do atendimento administrativo para, no mínimo, 12 horas ininterruptas, contemplando os três turnos de trabalho desta Instituição, com ganhos àqueles que necessitem de atendimento fora do horário comercial.
- PARA OS SERVIDORES - Possibilidade de utilização deste tempo extra para capacitação e qualificação, com ganhos de eficiência nos serviços prestados, além da provável melhora da qualidade de vida, com a redução de doenças relacionadas ao trabalho.
Assim, com o estabelecimento da jornada de 30 horas semanais e 06 horas diárias na UFTM, se atenderá ao interesse público, a função social da Universidade Pública e a valorização e a dignidade do trabalho humano dos servidores públicos.
Pois bem, passemos agora analisar os aspectos legais que envolve o tema em discussão.
A possibilidade de adoção da jornada de 30 horas semanais ou 6 horas diárias para todos os técnicos administrativos da UFTM, encontra amplo amparo legal, tanto na Constituição Federal, (Art. 7º e Art. 39, parágrafo 3º), como na legislação ordinária (Lei nº 8.112/90 e Decretos nº 1.590/1995 e Decreto nº 4.836/2003 e, ainda, no princípio constitucional da autonomia universitária.
A Constituição Federal elenca em seu Art. 7º uma série de direitos que visam à melhoria das condições sociais dos trabalhadores:
“Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;” (grifamos)
Já o art. 39, § 3º, da Constituição federal estabelece:
“Art. 39 –
(...)
§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo alei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”
Já o art. 19, da Lei no 8.112/90, reza que:
Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente
Passemos, pois à análise do decreto 1.590/1995, em especial de seu art. 3º, caput e §§ 1º e 2º, cujo a redação foi alterada pelo Decreto 4.836/2003. Ele estabelece o seguinte:
Art. 3º - Quando os serviços exigirem atividades contínuas de regime de turnos ou escalas, em período igual ou superior a doze horas ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, é facultado ao dirigente máximo do órgão ou da entidade autorizar os servidores a cumprir jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais, devendo-se, neste caso, dispensar o intervalo para refeições. (Redação dada pelo Decreto nº 4.836, de 9.9.2003)
Parágrafo Primeiro - Entende-se por período noturno aquele que ultrapassar às vinte e uma horas. (Redação dada pelo Decreto nº 4.836, de 9.9.2003)
Parágrafo Segundo - Os dirigentes máximos dos órgãos ou entidades que autorizarem a flexibilização da jornada de trabalho a que se refere o caput deste artigo deverão determinar a afixação, nas suas dependências, em local visível e de grande circulação de usuários dos serviços, de quadro, permanentemente atualizado, com a escala nominal dos servidores que trabalharem neste regime, constando dias e horários dos seus expedientes. (Redação dada pelo Decreto nº 4.836, de 9.9.2003)
Assim, do texto legal em comento, tem-se que a redução de jornada de trabalho pode ser autorizada se, cumulativamente, foram atendidos os seguintes critérios:
- Os serviços exijam atividades contínuas;
- O regime de trabalho ocorra por meio de turnos ou escalas;
- Ocorra atividade de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, compreendido este último como aquele que ultrapassar às vinte e uma horas.
Além disso, o atendimento destes requisitos não impõe à redução compulsória da jornada, mas apenas dá respaldo para que a direção da entidade possa decidir por esta redução.
Vale dizer: a decisão é discricionária, respeitados os limites vinculados estabelecidos pelo Decreto em comento.
Por isso tanto a Reitoria da UFTM quanto a nova gestão do Sinte-med merecem todos o reconhecimento e os elogios de todos, pois, quando da greve souberam dialogar para garantir a conquista ora em comento.
Feitos os esclarecimentos acima, urge esclarecer outras situações, que certamente será objeto de questionamento, de seus membros ou dos servidores em geral, durante os trabalhos da Comissão de 30h/UFTM.
São os esclarecimentos que entendo pertinentes:
a) DOS ADICIONAIS E AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO
Os adicionais e o auxílio-alimentação não podem ter seus valores reduzidos, com a implementação da jornada de 30h, uma vez que que a legislação que regulamenta estes benefícios não estabelece nenhum tipo de redução para o caso de jornada de trabalho semanal inferior a 40 horas.
Além disso, os servidores que continuarem trabalhando 40 horas semanais não terão nenhuma vantagem remuneratória, ou seja, não receberão nada há mais por isso, pois estarão trabalhando dentro da margem de horário legalmente estabelecida pela Lei n° 8112/90, a qual também prevê a carga horária de oito horas diárias
b) DA NÃO INTERFERÊNCIA NA CONTAGEM DO TEMPO PARA APOSENTADORIA
Como bem explica o Dr. Marcelo Trindade de Almeida, em parecer sobre o tema, entre os quais fulcro meu estudo, “quanto à contagem de tempo para a aposentadoria, a redução da jornada para 30 horas semanais não acarreta nenhuma interferência no tempo necessário para se aposentar, uma vez que a aposentadoria do servidor público se dá por tempo de contribuição, não havendo nenhuma relação com a jornada de trabalho diária desempenhada.”
c) DO INTERVALO PARA REFEIÇÃO
Conforme decorre do artigo 3º do Decreto nº 1.590/95, com a redação dada pelo Decreto nº 4.836/2003, o servidor que restar lotado na jornada de seis horas diárias e trinta semanais, não tem direito intervalo para refeições de no mínimo uma hora.
Em meu entendimento, contudo, até mesmo em respeito ao princípio da dignidade humana estabelecido no inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, este fato não constitui obstáculo para que seja garantido intervalo de 15 minutos para o lanche, aos servidores que passarem a trabalhar em jornada de seis horas diárias.
A título ilustrativo cito dois exemplos de IFES que, em suas portarias de instituição das 30h, estabeleceram o intervalo de 15 minutos para o lanche. O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina, através do art. 4º do anexo I, da Portaria 962/2011 e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia, através do parágrafo 1º, artigo 3º da Resol. 23/ 2012.
d) DA NÃO OCORRÊNCIA DE REDUÇÃO DE VENCIMENTOS
Finalmente, esclareço que não há base legal para que se reduza os vencimentos dos servidores que vierem ter a jornada de trabalho reduzida com a implementação das 30 horas na UFTM.
Era o que havia para esclarecer, sob censura de melhor juízo.
Uberaba, 27 de julho de 2014.
ADRIANO ESPÍNDOLA CAVALHEIRO
Adriano Espíndola Cavalheiro, é advogado trabalhista em Uberaba/MG e assessor jurídico de entidades sindicais. Membro do corpo jurídico da CSP Conlutas e da Renap – Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares. É presidente da Comissão de Movimentos Sociais da 14ª Subseção da OAB de Minas Gerais (OAB/Uberaba) e Coordenador Geral do Instituto de Advogados e Advogadas do Triângulo Mineiro. É articulista da ANOTA - Agência de Notícias Alternativas. Email: advocaciasindical@terra.com.br
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