O direito à gratuidade à Justiça é garantido pelo Art. 5º, LXXIV, da Constituição
Federal que diz “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”, portanto essa
garantia constitucional assegura aos hipossuficientes a prestação de assistência
judiciária gratuita.
Voltemos, pois, ao despacho da Quarta Vara Cível de Uberaba:
(...)
Vistos,
Intime-se a parte autora para, em
10 dias, comprovar sua hipossuficiência financeira, sob pena de indeferimento da
AJG, juntando aos autos a documentação pertinente, qual seja:
a. Cópia das últimas
folhas da carteira de trabalho, ou comprovante de renda mensal, acaso seja autônomo
ou desempregado apresentar Decore;
b. Cópia dos extratos
bancários de contas de titularidade, dos últimos 3 (três) meses;
c. Cópia dos extratos
de cartão de crédito, dos últimos 3 (três) meses;
d. Cópia da última
declaração do imposto de renda apresentada à Secretaria da Receita Federal ou cópia
da declaração de isenção;
e. Cópia das duas
últimas faturas de água, luz e telefone (observando o endereço residencial informado
nos autos);
f. Certidão atualizada
de propriedade de imóvel (is) e de veículo automotor;
g. 3 (três) últimos holerites.
UBERABA, data da assinatura eletrônica.
JOSE PAULINO DE FREITAS NETO
Juiz de Direito
Com todo o
respeito que eu tenho por todo e qualquer magistrado, o r. despacho acima
transcrito atenta não apenas ao direito da Justiça Gratuita, mas fere de morte
à própria Constituição Federal, porquanto, como eu já disse, não há previsão autorizativa no
texto constitucional para que o i. magistrado que o proferiu adote, de sua nobre cabeça, critérios que não foram previstos pelo constituinte para a concessão da gratuidade judiciária.
Não se pode perder de vista que para obter um Decore, além da dificuldade de encontrar um contador
que o emita, o interessado pela obtenção dos benefícios da justiça gratuita
terá que pagar honorários contábeis para tanto, pagamento também que terá que
fazer para obter a certidão atualizada de imóveis, o que pode ser uma barreira intransponível para muitos, muitos mesmo!
Além disso, o
fato, por exemplo, de uma pessoa ter um imóvel ou mesmo mais de um imóvel em seu nome, ou
ganhar acima de determinado valor, não quer dizer que ela tenha condições de
arcar com as custas de um processo e, ainda, com honorários sucumbenciais,
porquanto, muitas vezes sua renda está totalmente comprometida com o sustento
próprio e de seus familiares, fato elementar no direito, desprezado no despacho
em comento, comprometimento que daria ela direito de receber o benefício constitucional.
Seja a emenda colocada no projeto aprovado na Câmara dos Deputados, seja despachos como o acima em comento, com o máximo de respeito, são equívocos que servem apenas para afastar o direito dos mais pobres de se socorrerem ao judiciário para resolver seus problemas. Trazem em si, um espírito de porco, que pode ser traduzido no desejo de uma justiça elitista para os ricos, ao mesmo tempo que empurra os pobres para os juizados especiais, dos quais, nós Operadores do Direito, sabemos as deficiências que enfrentam e das dificuldades que impõe.
Em última
análise, ao afastar o acesso do judiciário aos mais pobres, esse equivocado
despacho e esse desprezível jaboti, atentam contra a própria manutenção da
advocacia, pois, quanto menos pessoas terem acesso ao judiciário, tanto menos
clientes teremos nós advogados.
Por fim, renovadas as vênias, o despacho e esta emenda restritiva em comento, deixa à nu a natureza de classe do judiciário, onde cada dia mais aos pobres e pretos do nosso país, é reservado apenas o seu ramo criminal.
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