A partir da dica do colega advogado Fernando Ramos, considerando as dificuldades que, nós advogados de trabalhadores, temos enfrentado nas Justiças Federal e do Trabalho, compartilho a decisão abaixo do Tribunal anulando sentença de primeiro grau por vício de perícia.
Adriano Espíndola.
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PROCESSO PREVIDENCIÁRIO. PERÍCIA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. ANULAÇÃO DO PROCESSO.
"Da simples leitura do laudo, no entanto, verifica-se que é demasiadamente sucinto, não sendo suficiente para a compreensão do real estado de saúde da parte autora.
A conclusão do perito não foi acompanhada de uma descrição adequada da patologia alegada pela parte e sua relação com o histórico laborativo apresentado, das queixas feitas por ela, das manobras realizadas no exame físico e dos documentos médicos analisados na perícia.
Cumpre anotar que, via de regra, nas ações previdenciárias em que se busca a concessão ou restabelecimento de determinado benefício por incapacidade, a prova pericial é o elemento de prova decisivo.
Entretanto, para que consubstancie meio de prova idôneo para instrução de um feito previdenciário, a perícia médica deve revestir-se de mínimo conteúdo, de maneira que o processo judicial, sempre iluminado pelo sobre-princípio do devido processo legal, ofereça ampla possibilidade de discussão sobre os elementos que servirão de convencimento do magistrado.
Para que se preste ao nobre fim de sua existência, a perícia médica exige mais do que conhecimento técnico pleno e integrado da profissão, pois sendo a atividade responsável pela produção da prova técnica em um processo judicial, não será digna deste nome a atividade que culmina com a produção de laudo médico-judicial que não logra decifrar a questão técnica, traduzindo-a fundamentadamente para as partes e para o magistrado.
Com efeito, o médico perito nomeado pelo Juízo, nada obstante - formalmente - atue como perito de confiança em processo judicial, tem o dever inderrogável de prestar todos os esclarecimentos de forma racional, de molde a permitir real debate sobre a prova que é crucial para os processos previdenciários por incapacidade.
Assim, o laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos:
- as queixas do periciando;
- a história ocupacional do trabalhador;
- a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados);
- os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados);
- o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão);
- o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando.
É evidente que uma perícia médica que observe tais condicionantes não será realizada em tão curto período de tempo. Mas é justamente com essa prudência e zelo que se espera seja produzida uma prova de tão realçada importância nos feitos previdenciários.
Quando a perícia judicial não cumpre os pressupostos mínimos de idoneidade da prova técnica, é produzida, na verdade, de maneira a furtar do magistrado o poder de decisão, porque respostas periciais categóricas, porém sem qualquer fundamentação, revestem um elemento autoritário que contribui para o que se chama decisionismo processual, que representa o arbítrio ou a subjetividade do juízo em que há ausência de referências fáticas determinadas com exatidão (e a decisão judicial) resulta mais de valorações, diagnósticos e suspeitas subjetivas do que de provas de fato.
Na espécie dos autos, conforme já referido, a prova pericial não atende as exigências mínimas de conteúdo de um laudo médico pericial e tal irregularidade não apenas implica um desrespeito à forma, mas dificulta sobremaneira a compreensão da real condição de saúde da parte autora, impondo-se o reconhecimento de nulidade processual.
Ressalta-se que, em razão da má qualidade da perícia, a sentença sequer aponta claramente os motivos pelos quais o julgador entende que não há incapacidade, o que torna a decisão também eivada de vício de fundamentação.
Por fim, verifica-se que não restou comprovado nos autos o exercício da profissão alegada pela parte autora, qual seja, empregada doméstica.
Nessas condições, e considerando que a sentença foi baseada em prova nula, impõe-se a sua anulação, sendo os autos remetidos ao Juízo a quo, para que seja realizada prova da atividade desenvolvida pela parte, bem como nova perícia, capaz de descrever claramente o quadro de saúde da requerente e suas limitações físicas. Após, deverá ser prolatada outra sentença pelo Juizado de origem, restando prejudicado o recurso da parte autora"
(RECURSO CÍVEL Nº 5001346-63.2012.404.7005/PR, Rel. Juíza Federal Flavia da Silva Xavier, j. 28/03/2014).
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