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Combate ao racismo: as leis não bastam, é preciso lutar com raça e classe

Empresa é condenada na justiça do trabalho a pagar indenização por racismo

por Adriano Espíndola Cavalheiro, de Uberaba

Especial para ANOTA

A Constituição Brasileira tem o combate ao racismo em dois dos seus mais importantes dispositivos. Primeiro, como um dos objetivos fundamentais da República (artigo 3º, Inciso IV). Segundo como um dos princípios basilares da República (4º, Inciso VIII). Já em seu artigo 5°, XLII, estabelece que a prática do racismo é crime inafiançável e imprescritível sujeito a pena de reclusão. Seguindo os mesmos fundamentos, na legislação penal pátria o racismo foi classificado como crime hediondo.

No entanto, decorrido mais de um século da abolição oficial da escravatura, a discriminação racial é uma lamentável e enrustida realidade do capitalismo brasileiro É comum ver negros e negras sofrendo preconceitos, os quais são, muitas vezes, praticados de forma velada. Falsas ideias como a posição inferior dos negros, inclusive de sua cultura, de suas manifestações religiosas e de sua capacidade intelectual, são difundidas no país pelas escolas, mídias, igrejas protestantes (as quais demonizam as religiões de origem africana), etc.

Neste contexto, é comum assistir - além do pagamento de salários inferiores para pessoas da raça negra e, ainda, a destinação a elas das vagas de trabalho para serviços ditos “inferiores” - trabalhadores negros (e negras) sofrendo preconceitos raciais, implícito ou explícito, por parte de seus empregadores.

Portanto, é a realidade que mostra que não bastam apenas leis e preceitos constitucionais para enfrentar o racismo, se faz necessária a compreensão, por negros e brancos, em especial pelos trabalhadores, que a discriminação racial está a serviço da exploração capitalista.

Neste sentido, o ideário de Zumbi dos Palmares, ícone da luta pela emancipação da raça negra – cuja memória celebramos neste 20 novembro – contínua atualíssimo, sendo a luta consciente contra o racismo a única forma de reverter a mentalidade preconceituosa presente no mundo do trabalho e em praticamente em todos setores da sociedade. É necessário que os trabalhadores e seus sindicatos compreendam que a luta contra o racismo deve ser feita em conjunto com a luta contra o capitalismo, com raça e classe!

Finalizo este artigo, retratando um caso de racismo que foi julgado pela Justiça do Trabalho de Minas Gerais e com sonhos renovados por um mundo livre do racismo e do capitalismo.

Empresa é condenada a pagar indenização por racismo

Uma empresa foi condenada na Justiça do Trabalho de Minas Gerais a pagar dano moral a empregada vítima de ato de discriminação racial praticado por seu superior hierárquico. Como foi apurado no processo, o gerente referiu-se à reclamante como “neguinha”, na frente de colegas de trabalho, de forma rude e agressiva, ato considerado discriminatório pelo Direito do Trabalho. Ao relatar o recurso interposto pela empresa e julgado pela 2ª Turma do TRT-MG, a juíza convocada Maria Stela Álvares da Silva Campos, destacou.

“A reclamada, por seu gerente, fez diferenciação da empregada por um pensamento usual e tão dolorosamente combatido na sociedade que é valoração das diferenças entre as raças, em uma crença que os traços físicos e culturais qualificam os seres humanos em superiores ou inferiores. O Direito do Trabalho não permite que o empregado, em seu labor, seja discriminado, insultado e ultrajado. Aliás, a conduta é banida pela própria Carta Republicana, que no seu pilar de constituição, que é o preâmbulo, assegura a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”.

A reclamante trabalhava nas dependências da segunda reclamada, como prestadora de serviços terceirizados, na função de ajudante industrial. De acordo com as testemunhas ouvidas, ela estava empacotando cigarros, com os demais colegas de trabalho, quando ouviu assovios seguidos de gritos do superior hierárquico, que a tratou de forma discriminatória e sarcástica. Dois dias depois, na presença de três testemunhas, o gerente ameaçou a reclamante com a dispensa sumária, caso houvesse qualquer denúncia acerca do incidente.

Considerando esses fatos, a Turma manteve o valor da condenação por danos morais, fixada em 50 salários mínimos. Além da empregadora direta da reclamante (empresa de terceirização de mão-de-obra, a quem cabia zelar pelas condições favoráveis ao trabalho, bem como pela integridade física e moral da autora), responde pela condenação a empresa tomadora de serviços, que se beneficiou do trabalho da reclamante e também porque é a empregadora direta do ofensor.

(RO nº 01131-2007-134-03-00-8 fonte http://goo.gl/gRpLvs)

Adriano Espíndola Cavalheiro é advogado militante e articulista da Agência de Notícias Alternativas.
Mantém o blog Defesa do Trabalhador - (blog integrante da rede ANOTA)

Contato: defesadotrabalhador@terra.com.br

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