Um analista de Tecnologia da Informação procurou a Justiça do Trabalho pedindo o pagamento de indenização por dano moral. Tudo porque, segundo contou, sofria preconceito, constrangimento e chacotas na empresa de locação de frotas, onde trabalhava, por conta da sua opção sexual. De acordo com o trabalhador, o próprio chefe fazia críticas e o diminuía perante os colegas. O caso foi submetido à apreciação do juiz Eduardo Aurélio Pereira Ferri, titular da 8ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que, após analisar as provas, concluiu que a versão apresentada pelo trabalhador é verdadeira. Considerando a conduta da empresa arbitrária, abusiva e inaceitável, o magistrado decidiu reconhecer o direito à reparação por dano moral.
A ré negou que desrespeitasse o reclamante. Na defesa, fez questão de registrar que ele tinha o pior desempenho na sua área de atuação. No entanto, ao analisar o processo, o juiz sentenciante teve certeza de que o trabalhador foi vítima de constrangimentos ao longo do contrato de trabalho. Uma testemunha confirmou que os colegas se referiam ao analista com expressões grosseiras e abusivas. Bicha, veado, incompetente e burro eram algumas das palavras a ele dirigidas, de acordo com a testemunha. Para o julgador, o fato de não serem ditas na presença do reclamante não retira a gravidade da conduta. No mundo contemporâneo, em nosso país, não há espaço para sequer comentar sobre a opção sexual de quem quer que seja, enfatizou na sentença.
O julgador constatou que o próprio superior hierárquico do analista de TI o constrangia publicamente. Também encontrou expressões desrespeitosas relacionadas ao reclamante em documentos anexados aos autos. Conforme apurou o magistrado, em uma oportunidade, o representante do réu na audiência fez questão de enviar cópias dos escritos aos demais empregados. Além disso, ele divulgou a história de um homossexual na empresa. Para o magistrado, uma forma de provocação e humilhação ao reclamante, já que a história nada tinha a ver com o objeto social da empresa. O real objetivo ficou claro: atingir o reclamante.
Constatou-se, portanto, que a dignidade e a honra da reclamante foi violada por conduta abusiva desenvolvida em seu ambiente profissional, razão pela qual o mesmo faz jus ao recebimento de uma indenização pelos danos morais sofridos, foi como decidiu o juiz, entendendo que os requisitos da responsabilidade civil se fizeram presentes no caso do processo. O entendimento foi mantido pelo TRT de Minas, que apenas reduziu o valor da indenização para R$5 mil reais.
( 0001348-40.2011.5.03.0008 AIRR )
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (de Minas Gerais)
(Abaixo a sentença original, sendo que adianto que o TRT/MG, refletindo uma visão bastante conservadora, no que diz respeito à indenização trabalhista por danos morais, reduziu a indenização constante da referida sentença de R$15 mil para R$5mil reais)
Ata de Audiência Processo nº 0001348-40.2011.5.03.0008
Aos 16 dias de dezembro de 2011, às 14h40min, na sede da 8ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, o MM. Juiz do Trabalho Eduardo Aurélio Pereira Ferri proferiu o julgamento da Reclamação Trabalhista proposta por XXXX contra COMPANHIA DE LOCAÇÃO DAS AMÉRICAS S/A.
Aberta a audiência, por ordem do MM. Juiz do Trabalho, as partes foram apregoadas. Ausentes.
Passou-se a proferir a seguinte sentença:
Vistos, etc.
1 - RELATÓRIO.
XXXX, qualificado na inicial à fl. 02, ajuizou reclamação trabalhista em face de COMPANHIA DE LOCAÇÃO DAS AMÉRICAS S/A, alegando em síntese que: foi admitido pela reclamada em 01/07/09, para exercer a função de analista de TI, tendo sido dispensado imotivadamente em 10/06/11; laborou em sobrejornada, não tendo contudo recebido pelas horas extras; não recebeu vale transporte pelo labor aos sábados; foi vitima de assédio moral razão pela qual vindica indenização por danos morais. Formula os pedidos discriminados às fls. 10/11, atribuindo à causa o valor de R$36.028,40. Juntou procuração, declaração e documentos.
Audiência inicial reduzida a termo na ata de fls. 67, oportunidade em que a reclamada apresentou defesa escrita. Na defesa, a reclamada sustenta que toda a jornada cumprida pelo obreiro encontra-se devidamente registrada, tendo as horas extras sido compensadas ou pagas; quando o autor laborou aos sábados usufruiu de folga compensatória, tendo sido fornecidos vales transportes para labor nos sábados; a reclamada não praticou qualquer ilicitude em face do autor ensejadora de reparação moral. Requereu a improcedência da reclamação. Juntou documentos, procuração e carta de preposição.
Manifestou-se o reclamante por escrito às fls.187/197, sobre a defesa e os documentos que a acompanharam.
Audiência de instrução reduzida a termo na ata de fls.231/233, oportunidade em que colheu-se o depoimento pessoal do reclamante e foi realizada a oitiva de duas testemunhas. Aduzindo as partes não terem mais provas a produzir, encerrou-se a instrução processual.
As partes arrazoaram oralmente e mantiveram-se inconciliadas, frustradas as tentativas conciliatórias.
É o relatório. Tudo visto e examinado.
2 - FUNDAMENTOS.
2.1. Horas Extras
Em sede de impugnação o obreiro afirmou que as folhas de ponto no período de 01/07/09 a 20/12/2010, estão corretas. E neste período o obreiro apontou labor em horas extras, consoante fls.116, 118, 127 e 129.
No tocante ao período de 21/12/2010 a 10/06/2011, a questão se restringe aos sábados, pois, como afirmado pelo reclamante os sábados laborados no citado período não foram registrados.
Contudo, a testemunha ouvida a rogo do autor não confirmou a ausência de registro. Ele disse que quando viajava aos sábados o ponto era registrado pela própria ré. A testemunha confirmou ainda, que conforme afirmado pela ré, o autor usufruía de 1h12min de intervalo(média).
Assim, tendo o autor apontado labor em jornada extraordinária, e não tendo havido comprovação do regular pagamento ou mesmo de compensação, condeno a reclamada a pagar ao autor as horas laboradas além da 8ª diária, acrescidas do adicional convencional de 100%.
Em razão da habitualidade condeno a reclamada a pagar ao autor os reflexos das horas extras em RSR, aviso prévio, férias +1/3, 13º e FGTS +40%.
Na liquidação deverão serem observados a súmula 264 do C.TST, o divisor 220,a evolução salarial do obreiro, os registros de ponto juntados aos autos, a fruição de 1h12min de intervalo, e a dedução de valores pagos a idêntico título. Na hipótese de ausente algum registro a jornada será considerada integralmente cumprida.
2.2. TRANSPORTE AOS SÁBADOS
Afirma o autor que não recebeu vale transporte para labor aos sábados. Os demonstrativos de pagamento comprovam o desconto relativo ao fornecimento de vale transporte. Os registros apontam o regular labor aos sábados.
Assim, competia a reclamada a teor do disposto no artigo 818 da CLT, comprovar matematicamente que forneceu ao autor vales transporte em quantidade suficiente, inclusive para o labor aos sábados.
Contudo, a ré não se desincumbiu de seu ônus probatório.
Ante o exposto, condeno a reclamada a pagar ao autor o valor de R$9,80, por cada sábado trabalhado, a título de indenização substitutiva pelo não fornecimento do vale transporte aos sábados.
2.3. DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
Pleiteia o reclamante o pagamento de indenização por danos morais sob o argumento de que teria sido vitima de preconceito, constrangimento e chacotas em razão da sua opção sexual, fatos inclusive praticados por seu superior, o qual constantemente o criticava e o diminuía perante os demais colegas.
A reclamada nega os fatos,aduzindo inclusive que o obreiro tinha o pior desempenho na sua área de atuação.
O dano decorre de um ato ilícito, que provoca, contra quem o praticou, a obrigação de repará-lo, fundando-se no princípio geral da responsabilidade civil.
É oportuna a lição de João de Lima Teixeira Filho: (...)O dano moral é o sofrimento humano provocado por ato ilícito de terceiro que molesta bens imateriais ou magoa valores íntimos da pessoa, os quais constituem o sustentáculo sobre o qual sua personalidade é moldada e sua postura nas relações em sociedade é erigida. (...)Todavia, para determinar se o ato do empregador enseja reparação por dano moral, além do possível dano material, é absolutamente imprescindível determinar o fato, sua ilicitude e enquadrá-lo juridicamente em um dos bens- intimidade, vida privada, honra e imagem- cuja violação propicia a pena pecuniária de natureza satisfatória.
A reparação ao dano moral encontra previsão legal específica na Constituição da República, em seu artigo. 5º, X, c/c artigos 186 e 942, ambos do Código Civil Brasileiro. Sua reparação, contudo, submete-se à configuração dos seguintes pressupostos: erro de conduta do agente, ofensa a bem jurídico e nexo de causalidade entre a conduta antijurídica e o dano causado.
São sempre lembradas as palavras de Sebastião Geraldo de Oliveira2: "Aguiar Dias citando Minozzi adverte que o dano moral não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor o mais largo significado.
O fundamento da reparabilidade do dano moral está em que, a par patrimônio, em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam simplesmente atingidos. O conteúdo do ressarcimento, nesta hipótese, está fulcrado em um caráter punitivo, como castigo ao ofensor, e em um caráter compensatório, que visa proporcionar à vítima alguma forma de que compensar o mal perpetrado.
No caso em tela, os constrangimentos suportados pelo autor encontram-se fartamente comprovados.
A testemunha ouvida a rogo do autor confirmou que expressões do tipo bicha, viado, incompetente , burro eram utilizadas nas conversas entre os demais colegas em referência ao obreiro. O fato de não serem ditas na presença do obreiro em nada altera o quadro fático. No mundo contemporâneo, em nosso país, não há espaço para sequer comentar sobre a opção sexual de quem quer que seja.
Registre-se que a testemunha da reclamada, foi efetivada como empregado somente após a dispensa do autor, laborando anteriormente na condição de estagiário, razão pela qual não merece credibilidade.
Também restaram fartamente comprovadas as assertivas de que o superior hierárquico de nome Fernando Coelho, constrangia e diminuia publicamente o autor. Vide os documentos de fls.22, 34/37, 40, 43, onde o preposto em questão utiliza expressões do tipo : Você tome postura profissional; questiona a dor do autor; enrolação. Além da utilização de expressões grosseiras e abusivas, o preposto em questão fazia questão de enviar cópia aos demais empregados. Para que não paire nenhuma dúvida da conduta arbitrária, abusiva e inaceitável do preposto em questão, o mesmo fez circular entre os demais empregados da ré, a história de um homossexual, o que so pode ser interpretado como provocação e humilhação ao obreiro, uma vez que a citada história nenhuma relação guarda com o objeto social da reclamada.
Constatou-se, portanto, que a dignidade e a honra da reclamante foi violada por conduta abusiva desenvolvida em seu ambiente profissional, razão pela qual o mesmo faz jus ao recebimento de uma indenização pelos danos morais sofridos.
Constatada a ocorrência de danos morais, passo a delinear os parâmetros utilizados por este Juízo para a fixação do quantum reparatório.
Conquanto não mensurável por critérios objetivos, o dano moral enseja uma reparação que dê à vítima a possibilidade de ter acesso a um bem material que lhe traga alguma alegria, amenizando, ainda que minimamente, a tristeza sofrida em decorrência dos atos da empregadora. Além disso, objetiva-se também punir a causadora do ilícito, desestimulando a repetição de situações semelhantes.
Dessa forma, quando da fixação do quantum indenizável ao dano moral, o Juiz deve analisar a situação particular da vítima e a condição pessoal da ofensora para não só encontrar um valor justo para a primeira, como também para atingir o patrimônio da segunda de forma a criar um forte fator de desestímulo à reincidência da prática desses erros, que acarretam tanto danos aos indivíduos quanto à comunidade.
Ante o exposto, considerando o grau de culpa da reclamada; o porte econômico da mesma, com capacidade patrimonial para responder pelos danos; as condições econômicas da vítima; e a gravidade dos danos, valho-me da experiência ordinária e do bom senso para arbitrar o valor da compensação pelos danos morais em R$15.000,00(quinze mil reais).
2.4. Justiça gratuita.
Defiro. O reclamante apresentou a declaração de pobreza (f. 14), pelo que entendo que estão preenchidos os requisitos para o deferimento da justiça gratuita art. 790, § 3º, da CLT. Este benefício é personalíssimo e absolutamente incomunicável a quaisquer terceiros, inclusive à reclamada, por falta de autorização legal específica em sentido contrário.
2.5. Juros de Mora e Correção Monetária.
Para liquidação, por simples cálculos, serão aplicados os índices de correção monetária conforme a Súmula 381/TST. Sobre os valores dos créditos atualizados, serão computados os juros de 1% ao mês (simples), pro rata die a partir do ajuizamento da ação, até o pagamento do crédito ao autor (Lei 8.177/91 e Súmula 200/TST).
A correção e os juros de 1% relativamente aos danos morais, serão contados a partir da data de prolação da sentença.
2.6. Recolhimentos do IRRF e das Cotas Previdenciárias.
O imposto de renda sobre os créditos trabalhistas reconhecidos em juízo deve incidir mês a mês, conforme a Lei 12.350 de 20 de dezembro de 2010, que acrescentou o art. 12-A a Lei 7.713, de 22 de dezembro de 1988, bem como a Instrução Normativa 1127/2011 da Receita Federal e Decreto 3000/99, de 26/03/1999. E, os juros moratórios não sofrem a incidência do desconto do imposto de renda, conforme a OJ 400 da SBDI-1 do C.TST.
As deduções previdenciárias deverão ser feitas nos moldes do artigo 879 (em especial os §§ 1º-A, 1º-B e 4º) da CLT, da Lei 8.212/91 (artigos 28 e 43/44) e Decreto 3.048/99 (artigo 276), considerando-se aqui o fato gerador da obrigação a prestação dos serviços art. 43 da Lei 8.212/91, com juros, multa e correção monetária segundo a tabela e a legislação adotada pela União (INSS)-, ônus do réu, por não procedidos os descontos e recolhimentos no curso do contrato de trabalho.
3 - CONCLUSÃO.
Pelo exposto, julgo PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos formulados para, condenar a reclamada, COMPANHIA DE LOCAÇÃO DAS AMÉRICAS S/A., a pagar ao reclamante, RICARDO DE REZENDE LIMA SILVEIRA, como se apurar em liquidação, observada a fundamentação supra, que integra este dispositivo para todos os efeitos: 1) horas laboradas além da 8ª diária, acrescidas do adicional convencional de 100%, com reflexos em RSR, aviso prévio, férias +1/3, 13º e FGTS +40%; 2) R$9,80, por cada sábado trabalhado, a título de indenização substitutiva pelo não fornecimento do vale transporte aos sábados; 3)R$15.000,00, a título de danos morais.
Incidirão juros e atualização monetária, na forma das Súmulas 200 e 381 do TST e da legislação pertinente aos créditos trabalhistas.
Sobre os valores atualizados incidirão juros de mora, simples, de 1% ao mês, pro rata die a partir do ajuizamento da ação e até o efetivo pagamento do crédito.
A correção e os juros de 1% relativamente aos danos morais, serão contados a partir da data de prolação da sentença.
Serão deduzidos os valores referentes à parcela devida pelo empregado ao INSS, sendo de responsabilidade do empregador o pagamento de multas e juros decorrentes da mora no recolhimento dessa parcela, observando o valor da contribuição já recolhida pelo segurado à previdência social no curso do pacto de trabalho.
Ficam autorizados os descontos legais cabíveis. As cotas previdenciárias serão discriminadas e recolhidas pelo reclamado nos moldes do artigo 879 (em especial os §§ 1º-A, 1º-B e 4º) da CLT, da Lei 8.212/91 (artigos 28 e 43/44) e Decreto 3.048/99 (artigo 276), considerando-se aqui o fato gerador da obrigação a prestação dos serviços art. 43 da Lei 8.212/91, com juros, multa e correção monetária segundo a tabela e a legislação adotada pela União (INSS)-.
Possuem natureza salarial as seguintes parcelas: horas extras e reflexos em 13º salários. E possuem natureza indenizatória as demais parcelas.
O imposto de renda sobre os créditos trabalhistas reconhecidos em juízo deve incidir mês a mês, conforme a Lei 12.350 de 20 de dezembro de 2010, que acrescentou o art. 12-A a Lei 7.713, de 22 de dezembro de 1988, bem como a Instrução Normativa 1127/2011 da Receita Federal e Decreto 3000/99, de 26/03/1999. E, os juros moratórios não sofrem a incidência do desconto do imposto de renda, conforme a OJ 400 da SBDI-1 do C.TST.
Defiro ao reclamante a justiça gratuita.
Custas de R$400,00, pela reclamada, calculadas sobre o valor arbitrado à condenação de R$20.000,00.
Atentem as partes para a previsão contida nos artigos 17, 18 e 538, parágrafo único, todos do CPC. Registro que não cabem Embargos Declaratórios para rever fatos, provas, a própria sentença ou, simplesmente, para contestar o que foi decidido (CLT, art. 897-A e CPC, art. 535). Observe-se, ainda, que a Súmula 297 do TST determina a necessidade de pré-questionamento em relação à decisão de 2º grau, sendo inaplicável para as sentenças de 1º grau.
Intime-se a União.
Intimem-se as partes.
Encerrou-se.
Eduardo Aurélio P. Ferri
Juiz do Trabalho
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